sábado, 11 de agosto de 2012

Esponja



Entristeces-te com o presente, estás cansado – cansado de ti. Queres que te ponha a mexer. Dizes-te farto dessa poltrona onde te encaixas como uma esponja ensopada - água a mais.

- Vá lá dá cá uns jeitos. Agita-me os braços, solta-me as pernas, enche-me este peito de músculos que tardaram a vir. Ajeita-me.

Tudo em ti reflete essa preguiça tardia. Vais correndo como a vida te deixa correr. Quando não há vento que te valha esse arrastar demoroso pedes-me a mim que te mova. Que te puxe, rasteja, empurre.

Tens essa ânsia de viver o futuro. De passares à frente como cavalo de corrida, babado pela recompensa do primeiro lugar. Tens essa ânsia de ti. Uma pressa demorada, a querer imitar os heróis defuntos que na glória se afundaram.

A tua expressão macilenta bem mostra aquilo que és. Estás acabado mas preferes mentir aos espelhos e guardar esse teu passado vitorioso pela calada - na cobardia do teu presente.

 Alojas-te no futuro, na segurança da promessa de uma eternidade jurada pelos teus sonhos de pequeno.  Aqueles sonhos que não eram teus, de outros. Sempre te serviram, acomodavas-te com o fácil e nunca te importaste de com o fácil obteres a razão. Ambições de gente arrogante eram também as tuas ambições. Seguiste linhas retas e não te preocupaste em lhes dar uns toques curvos, desajeitados- bonitos.

Agora olha para ti, enfrenta esse teu presente que tanto receias. Mostra-te. Mostra-te a esse mundo que querias honrar, a essas pessoas a que engraxavas o sapato e a inteligência. Decerto te louvarão pelo despacho com que te sentas, pela forma como inchas ao repousares os teus belos feitos nesse cadeirão, nessa amostra rasca de trono feita não por ti – por outro.

- Ajeita-me. Vá, que os anos que acarto travam-me a energia. Já não consigo, mas tu consegues, fá-lo. As pessoas gostam de ver, vá.

Assentas. A sociedade fica-te bem, combina contigo. Nada fica mais assente que não tu – esponja ensopada, inchada, flácida. Como em toda a vida - correste ao sabor de nada, e esse teu insonso faz-te cansar. Cansar de ti e do teu cobarde destino.

Ajeita-te.

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