sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Felizes são os doentes



- Chama-se amor, a menina nunca ouviu falar? Há quem tenha…

 Mentira. Eu não posso ter o amor, ele sim - tem-me a mim. Não poderei ter algo que tanto quebra, tanto muda, tanto fica – e alastra. Ficaria doente de mudanças, doente desse mal que é a paixão. Ai como adoramos estar doentes, de nariz pingado e lenços no bolso. Como adoramos ter aquilo que não devíamos ter. E vamo-nos viciando nessa doença, facilita-nos as coisas - dizermos que estamos doentes, as pessoas desculpam quem está de cama. É um remédio - a própria doença é a cura em si. Esse amor que estragou, talvez de tanto estragar, tornou-se a salvação.

 E as pessoas acreditam nisso, e de tanto acreditarem – no amor se viciam. Ainda bem – deixem-se viciar, que uns dias de febre só fazem bem à alma. Só fazem bem ao coração. Não se preocupem, novos remédios se irão inventar – o homem sempre trata de inventar tudo. O homem não entende – ninguém entende - que o verdadeiro remédio são dias de cama eternos, noites de febre infindáveis e um maço de lenços no bolso durante toda a vida.

- A senhora tem?

Não tem. Ela não sabe o que é o amor, porque se soubesse - não falaria. Quem sabe não fala, apenas o escuta, o sente – o vive. E não trata, não procura curar. Quem tem amor dele não se quer ver livre. Mas deixem. Há quem goste de hospitais. Não os repreendo, afinal aguentar amor eternamente é tarefa que o coração nem sempre suporta, há quem sofra de ataques – o coração pesa e a alma também. Foram remédios a mais durante toda a vida – tentativas de cura – suicídios da emoção.

- Claro que tenho, sou uma pessoa com muito amor para dar até. A menina devia saber.

E sei, que amor dá-se. Às tigelas, aos lotes, em sacos, em barris – dá-se. A quantidade é gerida. Isso não é dar, é racionar amor. Dá-lo aos poucos, economizá-lo. Quem o poupa não o quer, na verdade nunca o quis. Quem o gere tem medo, medo de o perder. O amor não se perde, apenas se dá – a inesgotável doença…

- E eu sei. Tenho andado doente.

- Não mude de assunto – vá- se curar.

- Não quero que me curem, quero que me viciem.