Um desastre.
Como se por cada palavra que te tirava, tiravas-me tu um bocado do meu
coração. Era como uma troca, um pacto. Alianças, espécie de negócio ilegal.
Quão errado é negociares pulsações do teu coração só para obteres umas
miseras palavras de quem dele se ocupou. E não mais saiu. Vai saindo assim, a
roubar-te pedaços. A negociar palavras. Coisas secas e sem significado que até
gostas de ouvir para adiar esse desastre. Com esperança – adiar até outro
negócio mais rentável aparecer.
Mas tudo ilegal. Que coisas de sentimentos só dá chatices burocráticas
para as quais não temos dinheiro para pagar. Que o amor quer-se é a fugir, a
correr por entre as pernas. Um fugitivo que ganha a sua vida com negócios desta
laia – trocas injustas mas que sossegam almas apaixonadas.
Quão certo é registar todas as faltas, desilusões, facturas por pagar
que o amor obriga. Diria um desastre. Tal e qual como se sentisses falta da
memória que te apaixonou- de tão leve era que se escapou no meio desses
tratados fora da lei, a troco de palavras e sinónimos para a corrosão de ti
mesmo.
- Amo-te - disse em voz alta.
E como por receio o tolo que ouviu esta bela palavra debruçou-se sobre
o traficante, e a modos como que para ninguém ver, perguntou
- Quanto te devo?
Um desastre, porventura.