Hoje acordei. E sei lá – apeteceu-me. Não são todos dias, mas hoje foi
assim - qualquer coisa de especial teve para me acordar.
É um palpite, como tantos outros que por aí andam. E de vez em quando –
muito de vez em quando – eles estão certos. Talvez seja por isso que acordei,
porque quem sabe talvez o meu esteja certo. De todas as vezes que errei, uma delas
teria de acertar.
- Porque não hoje?
Pensei. Ou melhor – escrevi. Porque se o digo alto não me deixo
acreditar. Não poderia acreditar. Há coisas que se devem manter assim –
incrédulas – como os palpites. Não porque não se devem saber, mas porque assim
não enfrentam a severidade da vida. Essas palavras mergulhadas em inocência,
que experimentam o íntimo e testam as memórias. Creio eu que é isso que me faz
acordar. Essa ingenuidade que nos assola, apodera, transforma.
De tal forma que hoje apetece-me ser palpite. Porque sei lá – não posso?
Esta pele hoje não está para mim. Demasiado presa – talvez – demasiado minha. Por
isso acordei. Palpite. E eu preciso de flutuar, como essas palavras inocentes
flutuam. Preciso de ser palpite, um rasgão de sorte desejado, uma surpresa
iminente, uma contagiante esperança. Quero ser a dinâmica da minha vida, por um
só dia, quero ser uma opção, um pressentimento ou talvez um presságio. Quero
divagar, ser a excepção, o sexto sentido, a fé. Voar nesse véu de ignorância. Ser escolhida por alguém que possa
dizer:
- Foi só um palpite.
E que esse acaso esteja certo – esse eu que virou sorte para outro.
Afinal de contas, de todas as vezes que se erra, numa delas tem de se acertar. E
porque não hoje possa eu vir a ser a razão de alguém acordar?